quarta-feira, 16 de dezembro de 2015

A violência na Literatura

Esta monografia versa sobre a trajetória brasileira constituída em um cenário de violência e opressão do Estado sobre seus cidadãos e da influência para a literatura da fragmentação do sujeito imerso nesse contexto. Partindo da premissa de que para o presente fazer sentido é necessária a compreensão dos processos históricos que nos trouxeram até aqui, inicialmente são analisadas as diferentes estratégias de legitimação que permearam governos autoritários no século 20, até a deflagração do golpe civil-militar, em 1964. 

A partir disso, os efeitos causados pela repressão cultural do regime nos anos de chumbo, além de sua interferência nas condições de produção na música e na literatura, são analisados com a exemplificação dos elementos constitutivos da canção Apesar de Você, composta em 1978, por Chico Buarque. 

No que tange às cicatrizes deixadas pelo período civil militar, é realizada a análise da narrativa testemunhal do romance O Irmão Alemão, escrito em 2014 também por Chico Buarque, no qual é investigada a representação do trauma e da fragmentação de um sujeito distópico.

Como citar a monografia:
LORO, Luis Felipe. Distopia e Trauma no romance O Irmão Alemão, de Chico Buarque. Novo Hamburgo/RS: Editora Feevale, 2015.


terça-feira, 28 de julho de 2015

Os segredos de Susanita

Ninguém tinha tempo ou interesse para ouvir o que Susanita tinha a dizer. E eram tantas coisas! As descobertas na escola, a discussão com a melhor amiga, a inconformidade em ter que arrumar o quarto todo santo dia, a paixão secreta pelo vizinho, um garoto bonito e dois anos mais velho. Pensando bem, algumas coisas Susanita preferia que ninguém soubesse. Corava só de imaginar que seus segredos pudessem um dia ser revelados ao mundo. Sentia-se boba de repente, e os pensamentos iam longe.

Pensou em ter um amigo imaginário. Mas...muito sem graça! Além do mais, se era para falar com alguém invisível, então ela poderia muito bem continuar apenas com os próprios pensamentos. Foi a dinda Vitória, a mulher mais linda que Susanita conhecia, quem encontrou a solução para o problema.

Sem necessidade de data especial ou comemoração, em um desses almoços de domingo, a dinda lhe trouxe um presente. Em um pequeno embrulho amarelo, havia um caderno, que depois Susanita identificou como sendo, na verdade, um diário.

- Tu já está ficando mocinha – disse a dinda Vitória – daqui uns tempos, vai querer lembrar como pensava no passado – encerrou ela, piscando.

Radiante, a menina desandou a escrever. Faltavam folhas para dar conta de tantas ideias. Umas bem malucas, aliás. Mas não tinha problema, porque a garota jamais relia aquelas linhas. Depois que a caneta feria o papel, era como se aqueles segredos não fossem mais dela, e ela não tinha o direito de violá-los.


Era esse o trato. Susanita não lia os segredos do diário, e o diário protegia os pensamentos de Susanita.

Somos o que há de melhor


Queria ser muito daquilo que não sou. Queria esperar menos das pessoas. Não me preocupar tanto com o futuro. Acordar tarde. Encher a cara em plena terça-feira. 

Onde estão os cigarros, a bebida, as orgias?

Ser assim, um pouco irresponsável. Há uma certa poesia em quem não leva nada tão a sério, se espreguiça com leveza, com quem tem aquele ar vagamente perdido de sempre estar decidindo para o onde vai.

Sei que o mundo precisa de um pouco de irracionalidade às vezes. A vida já tem manchetes negativas demais: crise política, a alta da luz, o 7 a1.

Queria não estar nem aí. Arrependimentos? Nunca! 

Ah! Se pudéssemos ser tão bons quanto achamos que somos! 

Enquanto aquela velha hipocrisia nos cega, somos o que há de melhor. 

E de pior também.

segunda-feira, 13 de julho de 2015

A morte nossa de cada dia

Morri ontem, ao fechar os olhos antes de dormir. Morri hoje, logo depois de depositar a xícara borrada de café em cima da pia. Provavelmente, terei morrido outra vez, após terminar de escrever este texto que você está lendo. Morremos várias vezes todos os dias, mesmo sem flores, sem choro e sem cochichos nos cantos de uma sala fúnebre.

 Procuro em vão recuperar a criança que um dia fui, mas até mesmo minhas recordações são traiçoeiras. Ao olhar para trás, o faço com os pensamentos de hoje. Não posso saber o que eu pensava, o que eu temia, quais eram minhas ilusões e devaneios. Lembranças difusas se misturam com lacunas que a minha imaginação procura completar, e que muito devem estar distantes da realidade.

Resigno-me a aceitar que aquele menino magricelo ainda possa existir, quem sabe em algum lugar do tempo, jogando bola na rua até o céu escurecer.

O tempo é intransigente. Mata aos poucos. Nessa reciclagem diária, nos afastamos lentamente do que éramos. Quando nos damos conta de nossas muitas mortes? Quando, enfim, deixamos de reconhecer como parte nossa o passado que um dia habitamos? Para onde foi aquele desejo? Para onde foi aquela leveza? Onde andarão os planos apaixonados daqueles fins de tarde?

O que mudaria se soubéssemos a data de nossa morte?


O que mudaria se nos déssemos conta de que já estamos morrendo? 

quarta-feira, 22 de abril de 2015

Um velho aprendizado


Suspeita-se que o ódio de Hitler pelos judeus nasceu ainda na infância, quando ele passou por uma experiência traumática com a morte prematura de sua mãe. É possível. Já escrevi outras vezes que o que somos e tudo aquilo em que acreditamos se baseia principalmente nas experiências da infância e da adolescência.

Eu, por exemplo. Lembro de uma tarde cinzenta. Eu tinha uns três anos, talvez quatro, e assistia à minha mãe preparando alguns sanduíches. Pareciam apetitosos, então, decidi que não descansaria enquanto não pudesse experimentar um deles. A verdade é que incomodei muito para ganhar aquele pedaço de pão. Não cedi nem mesmo aos argumentos de que havia acabado de almoçar

Ameacei chorar. Com crianças e mulheres, você sabe, é melhor evitar o choro, porque ninguém sabe bem como fazer depois para contornar a situação. Por fim, ganhei o tão esperado sanduíche. Mordisquei-o com interesse, depois cheguei à conclusão de que, realmente, eu não sentia fome alguma. Além do mais, aquele sanduíche tinha um gosto amargo, que mais tarde eu descobriria ser de mostarda. E agora?, pensei. O que fazer?

Disfarcei, e lentamente fui me dirigindo para os fundos do quintal. Quando ninguém estava olhando, joguei fora o quase intocado sanduíche. Desconfio que não o tenha escondido muito bem, porque meu delito infantil foi descoberto em pouco tempo, e rendeu umas boas ralhadas de minha mãe.

O que tirei de lição deste dia?

Não se deve comer nada com mostarda.

Jamais.

Incrível como as experiências da infância nos ensinam.

quarta-feira, 1 de abril de 2015

Maioridade penal: maquiando o problema


Falávamos ontem, durante uma aula na Feevale, sobre a dificuldade do brasileiro em debater questões polêmicas. Aliás, até já escrevi sobre isso. Aqui, ou você é a favor, ou contra. Não há espaço para a ponderação e nem para a análise de opiniões contrárias.

Os argumentos frágeis de ambos os lados expõem a fragilidade de um povo que não se sente amparado pelo Estado, e ao se sentir desprotegido, tenta resolver seus problemas de insegurança do modo que lhe parece mais fácil, mas que tende a dar terrivelmente errado.

Nestes dias em que se discute a redução da maioridade penal, é preciso reconhecer que o sistema presidiário brasileiro faliu. De Norte a Sul, o que temos são cadeias superlotadas, presos em condições sub-humanas, e o comando da criminalidade continua sendo feito de dentro das celas fétidas do Brasil. Ali, homens enclausurados dividem o espaço com ratos, contraem doenças, são currados pelos colegas de prisão; e, obviamente, saem piores do que entraram. Talvez isso explique o índice de reincidência nas prisões ser de 70%.

Há presos demais no Brasil. A grande maioria por causa do tráfico de drogas. Regulamentar o comércio da maconha, como o Uruguai fez com sucesso, seria uma das soluções que amenizaria esse problema. Além disso, em um país que a educação fosse prioridade de fato - e não apenas slogan governamental -, em um país que dá condições mais igualitárias aos seus cidadãos, certamente menos jovens recorrem à criminalidade.

Aos que se escandalizam com a possibilidade, uma informação importante: na Holanda, há menos usuários de maconha hoje do que quando o consumo era proibido. Ou seja: uma substância lícita parece perder seu poder de atração sobre os jovens. E mais: legalizar não é incentivar o consumo, trata-se apenas de regulamentar algo que o Estado jamais foi capaz de combater.


Os estudos sociológicos e criminalísticos que evidenciam a ineficiência da redução da maioridade penal no combate à violência não podem ser ignorados, nem o fracasso de outros países que tentaram medidas semelhantes no passado. Precisamos tratar as causas, e não os efeitos da criminalidade. E, acima de tudo, precisamos debater essas questões com mais razão e menos emoção.

domingo, 29 de março de 2015

Que mulher chata!


Foi um amigo meu quem me disse, dias atrás: “Sabe aquela gostosa? Conversei com ela. E, cara, ela é muuuuuito chata!”.

Fiquei impressionado, porque aprendi a não menosprezar a ênfase de uma palavra com as vogais estendidas dessa forma. Meu amigo estava realmente decepcionado. Também pudera. Endeusou quem não merecia ser endeusada. Aliás, existirá alguém que mereça? Duvido.

Mas o fato é que, tanto para homens quanto para mulheres, chatice embaranga. De nada adianta ter uma bunda de parar o trânsito, ou um bíceps avantajado; se o seu papo for entediante. Nestes tempos em que está tão fácil conseguir sexo casual, ter algum conteúdo é um grande diferencial.

E aqui, faço um adendo. Não tenho nada contra o sexo casual, pelo contrário, acho que o mundo seria um lugar melhor se as pessoas se aproveitassem mais; mas acho triste imaginar que possa existir alguém – homem ou mulher -, que possa ser classificado em “para transar” e nada mais.

Roupas de marca, maquiagem, a aparência física. Tudo isso pode até ajudar uma pessoa a se tornar mais atraente, mas, se esses forem os seus únicos investimentos realizados em si mesmo, você corre o risco de desapontar as pessoas ainda na primeira conversa.


O que aconselhei ao meu amigo? Simples: pessoas chatas ou sem conteúdo, melhor deletar. Nenhuma bunda vale tanto sacrifício.