Mudar
de endereço dá muito trabalho, mas mais do que uma mudança de espaço físico, é
um reencontro com o passado. Você vai arrumar suas coisas e encontra objetos
que já haviam sido esquecidos há muito tempo. Um carrinho antigo. Um bilhete
amassado. Aquele álbum de figurinhas que deu tanto trabalho para completar. As
fotos de um passeio no ensino médio.
Mudar-se
é também nostalgia. É dar uma olhada para trás antes de seguir em frente.
E
nesse processo, encontrei um álbum cheio de fotos da minha infância. Tento
lembrar como eu era, como eu pensava, mas é um esforço inútil. Tudo o que sei
se resume em uma frase: fui uma criança feliz.
Posso
ser muito bem sucedido daqui pra frente, posso ter belas mulheres ou o amor
correspondido de uma só, posso conquistar o mundo inteiro, mas jamais serei tão
feliz quanto fui quando era criança.
Por
um motivo simples: só as crianças podem ser plenamente felizes. As crianças,
com seus risos e choros espontâneos, com seus olhões arregalados que observam o
mundo que as cerca, apenas elas podem compreender o que realmente importa na
vida, e por isso, serem felizes.
Observe
uma delas, ainda em tenra idade: ela não quer saber dos problemas da política
ou da economia, não se interessa pela discussão na casa do vizinho, nem se o
Internacional vai conseguir disputar a próxima Libertadores.
Tudo
o que ela quer é brincar. E a criança sabe que a brincadeira terá mais graça se
tiver mais alguém participando. Ela pode até brigar por causa de um brinquedo,
mas em poucos minutos terá esquecido a desavença. A criança sabe,
resumidamente, que o Outro é o mais importante.
E
assim, respeitando o Outro naquilo que ele é diferente – e as pessoas são
diferentes em tudo -, para que tenha alguém com quem brincar, ela é feliz.
Nós,
os adultos, nós temos preocupações, nós estamos sempre atrasados, nós nos estressamos
no trânsito, nós discutimos religião, nós traímos, nós guardamos mágoas, nós
nos perdemos em crises existenciais e enriquecemos os psicanalistas depois de
despejar nossas frustrações em um consultório branco.
Por
quê? Porque esquecemos da criança que um dia fomos. Esquecemos que na vida, o
mais importante não é a política, a economia, ou a religião. O mais importante
é a convivência com as outras pessoas, é a diversão que isso gera.
Hoje
mesmo muitas pessoas estão criando inimizades por causa da eleição de daqui a
alguns dias. É uma pena. Deveriam se discutir projetos, idéias, convicções, e
não reputações. Deveria se tolerar que o as pessoas são todas diferentes, por
isso votam em candidatos diferentes.
Quem
não poupa argumentos ferozes em discussões nas redes sociais, quem vai dormir
com raiva do colega que é do outro partido, deveria procurar lembrar da criança
que um dia foi.
Talvez,
lembraria também o que realmente importa, talvez se desse conta de que nenhuma
mágoa vale a pena, e assim, quem sabe fosse também um pouco mais feliz.