Nos
momentos finais de O Senhor Embaixador, obra de Erico Veríssimo, há
uma conversa marcante entre um homem, que está prestes a ser julgado
por um inclemente tribunal; e seu advogado.
Trata-se
de um caso perdido, uma audiência de cartas marcadas. Gabriel
Heliodoro sabe que será condenado à morte no dia seguinte.
Os
dois conversam em uma cela fétida e quase vazia. O leitor imagina
que Heliodoro esteja abalado por profundas reflexões acerca de sua
vida, seus erros, acertos e arrependimentos.
Bom,
pelo menos é isso que eu sempre imaginei que deveria acontecer com
as pessoas quando elas sabem que estão na iminência de morrer.Mas
não. Na conversa com o advogado, Heliodoro está calmamente
resignado, e tasca a seguinte pergunta:
“Vivi
cem vidas. Quantos podem dizer o mesmo?”.
Heliodoro
podia até ser um criminoso, mas nesse ponto estava certo.
Afinal,
um homem que aproveitou tudo aquilo que a vida pode lhe oferecer, que
teve inúmeras aventuras amorosas, bebedeiras inenarráveis, que
soube valorizar um amigo leal, que sorveu cada sopro de vida com
intensidade; este é com certeza um homem que viveu cem vidas.
É
um homem que, mesmo nas derrotas mais retumbantes, cai com a cabeça
erguida. Com arrependimentos, claro que sim, mas arrependimentos pelo
que fez; não pelas oportunidades que deixou passar.
Viver,
viver intensamente, viver sem tirar o pé; esse é o segredo para
construir um final no qual poderemos olhar para trás e sorrir com
satisfação daquilo que produzimos. É preciso viver não uma,
mas cem vidas.
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