Não
é bairrismo dizer que Erico Veríssimo é um escritor diferenciado, mesmo entre os grandes. Nenhum autor dentre
os que eu já li consegue descrever tão bem os dilemas da alma e do
comportamento humano, ninguém cria personagens tão verossímeis.
Até parece que em algum momento vão
sair do papel.
É
assim em O Senhor Embaixador, que
acabei de ler dias atrás. Um livro um tanto monótono no início, mas trepidante e
surpreendente no final.
Gabriel
Heliodoro é o embaixador em Washington de um país fictício da América Central,
um país em que quase toda a população é miserável. Ele enriquece de forma
ilícita, trai a própria mulher com a esposa de um de seus funcionários, finge
não ver as injustiças sociais que seu governo ditatorial comete contra o povo.
O embaixador é, portanto, um
criminoso.
Um egoísta que deixa as coisas se desenrolarem
daquela forma para que ele possa levar uma vida confortável.
Mas,
por mais paradoxal que possa parecer, – e é aí que Erico Veríssimo se
diferencia - ao ler o livro o leitor vai
aos poucos gostando da figura de Heliodoro, de seus gestos espontâneos, da sua
maneira de ver a vida e de tratar as pessoas. O leitor se dá conta de que o
Embaixador não é um homem mau.
Coloco
“o leitor” generalizando, mas a percepção é minha.
E
tem mais! Já no final da história, Heliodoro resolve travar uma batalha perdida
e nega-se a fugir mesmo com a iminente queda de seu governo. Prefere morrer sendo leal aos seus
companheiros, em um ato de renúncia a si mesmo e ao seu orgulho.
Um ato em que não há egoísmo, e sim
pura abnegação
Os
crimes de Heliodoro não deixam de ser graves por serem passivos. O dilema que o
livro impõe é expor a natureza humana como algo difícil de entender, justamente
por uma mesma pessoa ter atitudes grandes
em algumas situações e atitudes mesquinhas em outras.
Como
fazer um julgamento justo sobre uma pessoa, se ninguém é totalmente bom ou mau?
Somos uma salada de frutas de qualidades
e defeitos, como eu disse no discurso de formatura do ensino médio.
Ao
perceber isso, Erico cria personagens quase humanos, de carne, osso e
sentimentos, e faz com o que o leitor
reflita sobre atitudes, e não sobre pessoas.
Perfeito
o livro, valeu a pena seguir em frente nas partes chatas do começo da história.
Por algumas páginas cheguei a temer que o autor perdesse o rumo da história,
mas o Erico Veríssimo jamais o perde.