terça-feira, 30 de outubro de 2012

A promessa de um olhar - Final


Oscar mal havia conseguido dormir naquela noite. Conversara longamente com Marina, haviam falado besteiras, ela ria de tudo. Como um casal de apaixonados. Já no final da conversa, a jovem havia sussurrado:

-Adoro homens experientes...

E ele bebia aquelas palavras, com os olhos fechados, já imaginando todas as possibilidades que aquela mulher jovem lhe oferecia.

Marcaram de sair na noite seguinte.

Quando chegou ao trabalho, Oscar quase perdeu o ar. No bebedouro, para ser vista e admirada e desejada, lá estava Marina, com um vestido justo que destacava seu corpo curvilíneo e suas pernas longas, que na certa eram sustentadas por delicados pezinhos trinta e cinco...

Mhmhm... – gemeu Oscar baixinho, antes de ir para o seu lugar.

E lá passou o dia mais uma vez contando as horas para que chegasse o final do expediente. Marina não devia imaginar, pensou Oscar, que o que mais lhe fascinava não era o seu corpo esguio e insinuante, e sim os olhares que ela lhe lançava e que se derramavam pela sala, cheios de promessas.

Sim, aquele olhar trazia promessas. O que queria dizer, Oscar não sabia. Mais de uma vez chegou a pensar que se fitasse por muito tempo aqueles olhos seria capaz de se afogar no mar de mistério que eles sugeriam.

E então, Oscar compreendeu.

Não estava apaixonado por Marina, e sim por seus olhos. Mais exatamente pelo mistério daquele olhar, por tudo o que eles não diziam, mas deixavam subentendido.

Não aguentava mais. Era preciso declarar aquela paixão súbita e arrebatadora. No horário combinado, Oscar olhou nos olhos de Marina e tascou:

 - Eu amo os teus olhos, sabia? – e suspirou, apaixonado.

- Juura? – ciciou a moça – eu uso lentes de contato, a cor original nem é essa...

Oscar paralisou. Sentia-se enganado, reduzido ao mais idiota dos homens. Apaixonara-se por olhos falsos! Como pudera ser tão tolo?

Sem explicar nada, rosnou, sem encarar a moça:

-Não me procure mais.

E virou-lhe as costas, decidido.

Marina, incrédula e injustiçada como uma Desdêmona, não podia compreender o que havia feito de errado.

E Oscar, caminhando sempre, sentiu a cidade mais triste naquele seu retorno para casa, e concluiu, amargurado, que não se pode mesmo confiar nas mulheres.

segunda-feira, 29 de outubro de 2012

A promessa de um olhar (1)



Eram quatro e meia da tarde de uma terça-feira modorrenta, quando pousou na mesa de Oscar um bilhetinho, escrito em um pedaço rosa de papel.

Dizia apenas: “Me Liga...”.

E um número de celular.

Nada mais. A não ser... que o bilhete estava perfumado. Levemente respingado por gotas de um perfume suave que havia borrado um pouco nas bordas a tinta da caneta.

Oscar olhou para os lados. Seria alguma brincadeira de mau gosto? Havia tantas pessoas naquela empresa, todos sempre tão atarefados, todos passando de um lado para o outro... Poderia ter sido qualquer um, até o sem graça do César.

Mas e o perfume? Algo assim tão sutil só poderia vir da cabeça de uma mulher. Os homens são óbvios demais nas lides da conquista.

Decidiu: iria ligar. A vida pode ser generosa, por que não? E se fosse a Marina? Ela já vivia curtindo as suas publicações, elogiando o seu trabalho... Hein? Por que não? Procurou a moça com o olhar, mas não a encontrou. Ela era a mais jovem, mais bela, e mais desejada da empresa. Certo dia Oscar havia comentado:

- Eu acho que ela me olha diferente...

E os amigos riram, deixando-o constrangido. Tudo porque a moça estava no auge dos vinte anos, e o pobre Oscar beirando os inexoráveis quarenta.

Não importava. Iria ligar e pronto. Contou com ansiedade os minutos que faltavam para o fim do expediente, foi apressado para casa, quase atropelou uma criança no caminho. Sentia–se jovem novamente... Era ela, ele tinha certeza!

Antes de ligar, Oscar realizou um ritual. Banhou-se com sofreguidão, fez a barba, e até tirou com uma pinça alguns fios desnecessários da sobrancelha. Saiu cantando do banheiro. Pegou o telefone sem pensar duas vezes e digitou os números que estavam no bilhete.

Com o coração aos pulos, ele ouviu o telefone chamar uma, duas vezes, até que...

-Alô?

E Oscar, atônito, ficou sem fala por um instante.

Ele sabia! A voz era inconfundível. A disputada Marina!

Era ela!

CONTINUA AMANHÃ...

sexta-feira, 26 de outubro de 2012

Muito do que nós somos



Tem muito do que nós somos no lugar em que vivemos. Igrejinha, por exemplo, só é a referência que é em toda a região, em diversos aspectos, porque é uma cidade repleta de amadores.

A palavra amador é geralmente associada à incompetência. Não deveria. Porque amador é alguém que faz as coisas por amor. Alguém que se doa, que coloca seus esforços à disposição sem esperar algum tipo de ganho financeiro em troca disso. Ele quer ser recompensado, é claro, mas não com dinheiro, e sim sabendo que está contribuindo para a cidade em que vive ser um lugar cada vez melhor.

E a Oktoberfest de Igrejinha é também uma festa feita por amadores.

Por isso que funciona.

Enquanto pudermos nos orgulhar de viver na cidade do voluntariado, continuaremos colhendo os frutos disso e fazendo a melhor festa do Brasil.

E você, vai fazer o quê neste final de semana?

Venha para Igrejinha!

segunda-feira, 22 de outubro de 2012

As lágrimas da festa


Eu estava ontem nas cabines de imprensa no instante em que começou o show de João Neto e Frederico aqui em Igrejinha, e lá do alto vi algo que me chamou a atenção: escorados perto do estande de mini pizza, um casal discutia.

Sei que há casais discutindo em todos os lugares e momentos possíveis, por qualquer motivo que se possa imaginar, mas o que me prendeu naquela cena foi o fato de que a menina chorava. Ela era muito bonita, ou assim me pareceu de longe; e aquelas lágrimas de alguma forma a tornavam ainda mais bela.

Aliás, a tristeza quase sempre é bela.

E bom, as pessoas geralmente evitam chorar em público, a não ser que estejam acometidas de uma emoção realmente muito forte.

Por isso a cena me chamou atenção. Aquela menina chorava. O namorado gesticulava, parecia querer convence-la de algo. Por vários minutos observei os dois, ela sempre triste, ele sempre falando; e eu curioso, pensando: qual será o motivo de eles estarem assim em uma festa?

Então, quando o show já passava da metade, desci para comprar algo e passei perto do casal. Foram instantes breves, não mais do que alguns segundos, mas que foram suficientes para que eu ouvisse a voz magoada da menina perguntando:

-Mas e agora, como eu vou confiar em ti?

Apenas uma frase, e tudo se fez luz. Agora eu já sabia o que havia acontecido. O cara traiu a menina, e ela, apaixonada que estava, aceitava perdoa-lo. Mas como voltaria a confiar nele?

Me compadeci do cara. Um homem, quando trai a companheira, trai por apenas um motivo: fraqueza. O homem que trai é frágil porque quer provar a si mesmo do que é capaz. Ele acredita que a vida é uma eterna conquista, e para isso ele precisa ser um eterno conquistador.

Me compadeci porque sei também que o homem que trai é um perdedor. Alguém que derrotou a si mesmo, e essa é a pior derrota que pode existir.

Com as mulheres é diferente. Uma mulher quando trai, também o faz por apenas um motivo, só que diferente: vingança. É um gesto frio, minuciosamente calculado. A mulher se vinga de tudo, desde a apatia ou ausência do companheiro até uma traição do passado que ela fingiu engolir.

Por saber disso tudo, é que me compadeci do rapaz aflito na festa de ontem.  A menina que chorava jamais poderá confiar nele novamente, e nisso reside todo o mal da história. Um relacionamento pode funcionar até mesmo sem amor, mas jamais sem confiança.

Não há mais o que fazer, senão começar outra história. Insistir é mais do que perda do tempo; é auto­ilusão. As mulheres são mais frias do que os homens, tolos que são, supõem. Perdoam, mas não voltam a confiar.

quinta-feira, 11 de outubro de 2012

Amor é coisa séria


 As pessoas são diferentes em tudo, da religião em que acreditam ao seu prato favorito, mas são iguais na sua essência.

 Por isso a Psicologia funciona, desde que aplicada de forma competente.

 Porque é fácil para a Psicologia diagnosticar as pessoas naquilo que elas são iguais: as necessidades da alma. E uma dessas necessidades básicas é a de nos sentirmos amados. Todos queremos amor, desde freiras caridosas até gerentes impiedosos de banco.

 Não é novidade isso. O problema é que as pessoas distorcem o amor, razão pela qual não o encontram, e por isso se frustram em sucessivos relacionamentos que inexoravelmente fracassam.

 A verdade é que o único amor verdadeiro é o amor abnegado. É o amor que se entrega, que se doa, que renuncia a si mesmo. Um sentimento tão forte a ponto de colocar outra pessoa acima daquilo que nós somos.

O único amor verdadeiro é o amor dos pais.

 Só um pai ou uma mãe podem compreender plenamente o que é o amor, porque só eles amam de verdade. Só eles se entregam plenamente, só eles renunciam a si mesmos pelo ser que recebe o seu sentimento.

 Entre um homem e uma mulher, se ambos forem jovens, o melhor que pode existir em termos de relacionamento passional não é o amor que eles ainda não são capazes de compreender; e sim uma amizade colorida.

  A amizade colorida é a melhor coisa que o século 21 trouxe consigo; é uma relação que funciona, que não exige do outro o que ele não prometeu ou não pode dar. É uma relação que não banaliza o amor. Amor é coisa séria. 

É coisa de pai e mãe.

sexta-feira, 5 de outubro de 2012

Vida de incertezas


Meu Nome é Paulo.

Tenho 17 anos.

Gostaria de ter mais o que falar sobre mim mesmo, sobre sonhos, perspectivas, sobre o meu emprego e, quem sabe, sobre uma namorada. Mas não tenho sonhos, nem perspectivas, nem emprego e muito menos namorada.

Aliás, existe apenas uma coisa da qual eu tenho certeza que eu possuo.

Dúvidas.

Eu sei que isso deve ser normal em um adolescente, mas a minha situação não é nada normal, pelo menos para mim. A verdade é que não tenho vontade de fazer nada. Meu pai bebe e quase nunca fala com a gente. Quando está bêbado, ele se torna mais falante.

Na verdade, ele grita.

E depois, chora.

É horrível ver ele nesse estado, mas mais horrível é a vergonha de sair na rua depois de mais um dos espetáculos dele.

A minha mãe só sabe fazer duas coisas na vida: trabalhar e reclamar. Admiro ela, que dá um duro danado por mim e pelo meu irmão. Talvez um dia eu consiga dizer isso pra ela. Talvez.

Ah, e tem o meu irmão, o Andrei. Ele é mais velho e mais vadio do que eu, e está sempre metido em confusão. Ele vende drogas, e vive dizendo que vai parar, mas nunca para.

Por causa desses problemas todos é que eu não tenho vontade de fazer nada. Porque parece que vai ser sempre assim, parece que por mais que eu me esforce, as coisas sempre vão dar errado, e que pobre nasceu mesmo pra se fuder. Talvez sejam desculpas de uma mente preguiçosa e de um corpo vadio.

Pode ser.
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Sempre fui inteligente, mas nunca bom aluno. Por preguiça mesmo. Mas passando de ano já está bom pra mim, que tenho certeza que nunca vou precisar usar metade das coisas que se ensinam por aqui.

Sento ao lado do Piolho, que é como um irmão para mim. O apelido dele é Piolho porque uma vez, acho que na 6ª série, ele apareceu na escola com a cabeça toda raspada. E como ele odiou o apelido, acabou pegando. Hoje eu acho que ele já nem se importa mais. 

A aula de agora é muito chata.

Poliedros.

Eu nem acredito que daqui há uns seis meses vou me formar no ensino médio.

E depois, como vai ser?

Mais uma vez, tudo o que eu tenho são dúvidas.

quinta-feira, 4 de outubro de 2012

As novas mães



Por que todas as mulheres estão comprando 50 Tons de Cinza?

A resposta é óbvia: porque todas as mulheres estão comprando 50 Tons de Cinza.

É assim que funciona a mídia.

Pornô para mulheres casadas, é a definição que acabei de ler sobre a febre literária do momento.

As mães do século 21 consomem erotismo, portanto, e isso as diferencia das mães de outras epocas. As mães atuais são dinâmicas, modernas, trabalham fora. Não precisam de ninguém que as subjugue. Bem diferentes das mães de outros tempos, portanto.

Houve um tempo em que o símbolo da feminilidade era a maternidade. Não é mais. O barrigão perdeu lugar para o batom  e  o salto alto.

Foi a necessidade de a mulher sair para encarar o mercado de trabalho e terceirizar a educação dos filhos tornou as mulheres mais femininas e menos mães.

Paradoxalmente, a independência das mulheres está colocando no mundo filhos mais dependentes. Filhos com um carência afetiva muito grande, que se frustram buscando compensá-la com romances frustrados, com drogas, com fanatismo por qualquer coisa.

É em vão. Amor de mãe não se compensa. Não se compara.

A culpa é das mães. As pessoas estão se ofendendo a cada dia mais por causa de times de futebol, descobrindo conspirações políticas onde não há o que se descobrir, as pessoas descontam no mundo a sua fragilidade emocional.

Tudo culpa delas. Das novas mães.

Mas as mães também tinham o direito de viver um pouco para si mesmas.