quarta-feira, 22 de abril de 2015

Um velho aprendizado


Suspeita-se que o ódio de Hitler pelos judeus nasceu ainda na infância, quando ele passou por uma experiência traumática com a morte prematura de sua mãe. É possível. Já escrevi outras vezes que o que somos e tudo aquilo em que acreditamos se baseia principalmente nas experiências da infância e da adolescência.

Eu, por exemplo. Lembro de uma tarde cinzenta. Eu tinha uns três anos, talvez quatro, e assistia à minha mãe preparando alguns sanduíches. Pareciam apetitosos, então, decidi que não descansaria enquanto não pudesse experimentar um deles. A verdade é que incomodei muito para ganhar aquele pedaço de pão. Não cedi nem mesmo aos argumentos de que havia acabado de almoçar

Ameacei chorar. Com crianças e mulheres, você sabe, é melhor evitar o choro, porque ninguém sabe bem como fazer depois para contornar a situação. Por fim, ganhei o tão esperado sanduíche. Mordisquei-o com interesse, depois cheguei à conclusão de que, realmente, eu não sentia fome alguma. Além do mais, aquele sanduíche tinha um gosto amargo, que mais tarde eu descobriria ser de mostarda. E agora?, pensei. O que fazer?

Disfarcei, e lentamente fui me dirigindo para os fundos do quintal. Quando ninguém estava olhando, joguei fora o quase intocado sanduíche. Desconfio que não o tenha escondido muito bem, porque meu delito infantil foi descoberto em pouco tempo, e rendeu umas boas ralhadas de minha mãe.

O que tirei de lição deste dia?

Não se deve comer nada com mostarda.

Jamais.

Incrível como as experiências da infância nos ensinam.

quarta-feira, 1 de abril de 2015

Maioridade penal: maquiando o problema


Falávamos ontem, durante uma aula na Feevale, sobre a dificuldade do brasileiro em debater questões polêmicas. Aliás, até já escrevi sobre isso. Aqui, ou você é a favor, ou contra. Não há espaço para a ponderação e nem para a análise de opiniões contrárias.

Os argumentos frágeis de ambos os lados expõem a fragilidade de um povo que não se sente amparado pelo Estado, e ao se sentir desprotegido, tenta resolver seus problemas de insegurança do modo que lhe parece mais fácil, mas que tende a dar terrivelmente errado.

Nestes dias em que se discute a redução da maioridade penal, é preciso reconhecer que o sistema presidiário brasileiro faliu. De Norte a Sul, o que temos são cadeias superlotadas, presos em condições sub-humanas, e o comando da criminalidade continua sendo feito de dentro das celas fétidas do Brasil. Ali, homens enclausurados dividem o espaço com ratos, contraem doenças, são currados pelos colegas de prisão; e, obviamente, saem piores do que entraram. Talvez isso explique o índice de reincidência nas prisões ser de 70%.

Há presos demais no Brasil. A grande maioria por causa do tráfico de drogas. Regulamentar o comércio da maconha, como o Uruguai fez com sucesso, seria uma das soluções que amenizaria esse problema. Além disso, em um país que a educação fosse prioridade de fato - e não apenas slogan governamental -, em um país que dá condições mais igualitárias aos seus cidadãos, certamente menos jovens recorrem à criminalidade.

Aos que se escandalizam com a possibilidade, uma informação importante: na Holanda, há menos usuários de maconha hoje do que quando o consumo era proibido. Ou seja: uma substância lícita parece perder seu poder de atração sobre os jovens. E mais: legalizar não é incentivar o consumo, trata-se apenas de regulamentar algo que o Estado jamais foi capaz de combater.


Os estudos sociológicos e criminalísticos que evidenciam a ineficiência da redução da maioridade penal no combate à violência não podem ser ignorados, nem o fracasso de outros países que tentaram medidas semelhantes no passado. Precisamos tratar as causas, e não os efeitos da criminalidade. E, acima de tudo, precisamos debater essas questões com mais razão e menos emoção.