terça-feira, 29 de outubro de 2013

O travesti e eu

Como diria o eterno Barão de Itararé, de onde menos se espera é que não sai nada mesmo. Mas, a verdade é que nem sempre é assim. Domingo passado, por exemplo.

Já passava das onze da noite, eu estava parado próximo ao portão de saída da Oktoberfest, não havia mais nada de relevante que pudesse acontecer naqueles últimos instante de festa, até que...

Alguém sussurra no meu ouvido, ironizando: “Olha só, que gatas!”.

Olhei na direção apontada. Franzi o cenho, demorei para perceber. Eram dois travestis. Na verdade, eram dois baita travecos, desses que só se veem na televisão.

Aqui, preciso fazer um registro importante: não tenho nada contra travestis, ou qualquer opção sexual que fuja dos padrões. Quem me conhece, sabe disso. Aliás, se há algo que não me incomoda, é a felicidade dos outros.

Mas, voltando aos travestis. Não tinha como não olhar por um instante, afinal, aquelas eram pessoas...diferentes. Não posso imaginar a expressão que eu fiz; o que sei é que um dos travestis reparou no meu, digamos, “estranhamento”, e se ofendeu com isso.
O homem (ou a mulher, nunca sei), puxou o companheiro pela mão, e veio na minha direção, com o dedo em riste.

Fique paralisado. E agora?

Vou ser espancado!?

Então, o travesti chegou bem perto, e disparou:

- o guriiiii...

Bem assim ele falou. Sabe aquela voz forçadamente fininha, puxando as vogais? Pois é.

E eu ali, paralisado. Só olhando.

- O guriiii...- continuou o travesti – tu é feio.

E saiu, pisando firme.

Eu continuei lá, parado.

As pessoas lembram o que faziam quando dois aviões atingiram as torres gêmeas, ou o dia em que o Brasil ganhou a Copa do Mundo, pois eu sempre vou lembrar que, em outubro de 2013, um travesti me chamou de feio.


O Barão de Itararé não contava com o inusitado, o surpreendente. Concluo que deve ser porque ele não teve a oportunidade de conhecer a Oktoberfest de Igrejinha.

sexta-feira, 25 de outubro de 2013

Certa noite de inverno

Fazia frio, fazia muito frio naquela tarde longínqua em que chegamos à cidade de Esperança. Uma névoa densa e muito pesada tomava conta dos altos morros que protegiam o povoado, tornando o ambiente ainda mais cinzento. Eu estava triste, disso lembro bem. Aliás, vivia triste. Como alguém que ama o que faz pode viver triste? Pois é, eu vivia. Todos os dias, as palavras de meu pai ecoavam na minha cabeça: “Palhaço de circo? Tu és um desgosto, Raphael!”. 

Perdido em devaneios, nem me dei conta quando paramos. Ia começar toda a trabalheira de novo. Era assim toda vez que chegávamos em uma nova cidade, o cansaço da viagem se misturava com a necessidade de deixar tudo pronto. 

A trupe numerosa, mas silenciosa. Era bom aquele trabalho braçal, porque impedia que a mente se ocupasse de coisas ruins. O frio, penetrando o tecido da roupa, trazia uma sensação de desamparo ao entrar em contato com a epiderme. 

Ao cair da noite, era chegada a hora do espetáculo. Todos os sentimentos ruins se dissipavam. Eu queria guardar os sorrisos das crianças, assim aqueles instantes fugídios se tornariam eternos. Eu queria guardar os aplausos, queria guardar aquela paz. Eu queria congelar o que sentia nessas horas, mas era em vão. 

Sei bem o porquê de lembrar dessa noite, de lembrar dessa cidade. Foram tantas! Mas aquele lugarejo traria algo diferente. Na saída da última sessão, as pessoas andavam apressadas, protegendo-se do frio cortante e ansiando pelo calor de suas casas. Tudo isso eu acompanhava, espiando por uma fresta da imensa lona, enquanto lembrava, com leve melancolia, dos tempos em que eu também tinha um lar aconchegante e uma família para me receber quando as noites fossem geladas. 

Já me preparava para voltar ao convívio da trupe, quando aconteceu. Um menino, - de uns oito anos, não mais do que isso -, sendo conduzido pela mão de sua mãe, olhava para trás, relutante em deixar o local. 

  - Ô mãe...- disse ele, com ar decidido, - eu já sei o que eu vou ser quando crescer. 
  - E o que é? - perguntou a mulher, com ar curioso. 
  - Quer ser do circo! – exclamou.  

  Ela parou um instante, parecendo surpresa com aquela decisão repentina. 

  - Quero ser domador de leão – completou o menino, com olhar sonhador. 
  - Ia ficar lindo – disse a mulher, ajeitando uma mecha rebelde do cabelo do garoto.

Eles seguiram, mas era como se aquele diálogo continuasse se repetindo diante de mim; dez, vinte, trinta vezes. Só bem mais tarde é que resolvi entrar, quando a escuridão invadiu de vez a pequena cidade.


Era uma noite em que fazia frio, fazia muito frio.


"LEITORINHOS"

A Feira do Livro de Campo Bom está acontecendo nesta semana. Lá, antes do evento a Administração Municipal entrega VALE-LIVRO nos seguintes valores:

R$5,00 – para cada aluno da educação infantil
R$10,00- para cada aluno do ensino fundamental
R$20,00- para cada professor da rede municipal

Ações como essa precisam ser elogiadas; e mais do que isso, copiadas. Assim se formam novos leitores, assim se constrói uma Educação sólida e uma sociedade com mais dignidade.

Não é com retórica, e sim com AÇÃO.

sexta-feira, 18 de outubro de 2013

O que um salto alto nos ensina

Agora, um desabafo: não gosto de salto alto. Mesmo com todo esse papo de que ele deixa a mulher mais atraente, com o andar mais sensual; mesmo com toda a unanimidade a favor do salto alto, ainda assim prefiro mulheres usando calçados baixos.

Sei que há ocasiões em que o salto é indispensável. Bom, então que seja usado apenas nessas ocasiões. A meu favor, posso dizer que a minha opinião tem um certo peso, afinal,sou um grande admirador de pés femininos. Sobretudo se for aquele pezinho 35, delicado, besuntado todas as noites com creme Nívea, aquele pé macio e suave como a pele tenra de um bebê.

Mas estou me distraindo. O que importa agora é o salto alto.

Já ouvi até que o salto deixa a mulher mais feminina. Que a torna mais mulher. Isso é besteira: o poder da mulher está sempre nela mesma; nunca nos acessórios. Ou seja: quanto mais natural, mais atraente.

Faço todas essas divagações apenas para dizer que, na maioria das vezes, o simples agrada mais do que o sofisticado. Que a beleza das coisas está mais na essência do que na aparência. E que sim, o grande segredo da Oktoberfest de Igrejinha, que nesta sexta-feira começa mais uma vez, o grande segredo são os voluntários. 

É o que faz a nossa festa ser diferente de qualquer outra. Por mais que essa Oktoberfest seja potencializada a um nível mundial, a sua essência sempre será o voluntariado. E, se um dia essa visão deixasse de existir, então a festa correria o risco de se tornar como uma mulher que não abre mão de um salto alto: bonita; mas um tanto artificial. 


P.S: Jets Getz Los!

segunda-feira, 14 de outubro de 2013

Salada de partidos

Agora sim, caiu a ficha. Finalmente compreendi o que queriam dizer os coros de "Sem partido! Sem partido!", entoados em uníssono, nos protestos de junho deste ano. Eu via aquelas cenas e pensava: "Como assim, uma democracia sem partidos?!".

Mas, como disse, agora compreendi. Hoje, a presença de um partido político, seja ele qual for, tira um pouco da credibilidade de qualquer movimento do nosso país. Porque os partidos estão uma bagunça. Há mais siglas do que os eleitores são capazes de citar.

E o pior é que esse não é o maior dos problemas. O que realmente tira a credibilidade dos partidos é a falta de sintonia entre as cúpulas nacionais e estaduais. As mesmas legendas que digladiam em nível estadual, se abraçam em Brasília. 

E vice-versa.

Houve um tempo em que haviam confronto de ideias, debates acalorados. Hoje, não. Hoje, todos defendem praticamente a mesma coisa.

 É preciso uma reforma urgente. 


Continuo convicto de que toda democracia precisa de partidos políticos, mas que sejam partidos de verdade; e não cabides de cargos públicos, feitos de parcerias puramente eleitoreiras, como o que temos visto ultimamente.

quinta-feira, 3 de outubro de 2013

Campeonato sem graça


Nas grandes batalhas da vida, o primeiro passo para a vitória é o desejo de vencer. Quem disse isso foi Mahatma Ghandi, um gênio. Aliás, adoro usar citações de gênios, porque no caso de o texto ficar ruim; bom, pelo menos ainda há uma grande frase para salvá-lo.

Mas a frase.

Por que Ghandi disse isso? Ele não poderia ter dito que SEMPRE o primeiro passo pra a vitória é o desejo de vencer? Decerto que sim. Por que apenas nas grandes batalhas, então?

Aí que está. Ghandi sabia que um homem não pode vencer sempre, e que a derrota serve para moldar seu caráter. Além disso, é nas grandes batalhas que surgem os heróis e vilões, que se mostra quem tem fibra moral e é capaz de suportar as maiores pressões.

Por isso o Campeonato Brasileiro é tão chato. Na fórmula de pontos corridos não existe a grande batalha de que Ghandi falava, não existe uma final. E, assim como na vida, um time campeão deve se formar em grandes jogos, na tensão que emana das arquibancadas, no gol aos 49 do segundo tempo.

Ali sim, veríamos quem realmente tem espírito de campeão.

Alguém dirá que na fórmula de pontos corridos, todos os jogos são importantes. Ora, se todos os jogos são importantes, então nenhum é. Sendo assim, assistimos ao Cruzeiro levantar a taça com três meses de antecipação, em um dos campeonatos mais chatos da história, que é ironicamente disputado no país do futebol.


E eu aqui, sonhando com as grandes batalhas de que Ghandi falava. Que saudade de um campeonato com jogos decisivos!