terça-feira, 10 de junho de 2014

Um domingo decisivo

Luciano passou toda a faculdade sonhando em sair com a Rita, mas a timidez sempre o impedia de ir em frente e fazer o pedido. “É muita areia”, pensava ele, contemplando de longe as curvas sinuosas da morena, os longos cabelos ondulando enquanto ela caminhava.

Até que, certo sábado, bebeu umas cervejas, tomou coragem e aproximou-se, em uma das salas quase vazias da biblioteca “É agora ou nunca”, prometeu a si mesmo, mal sentindo as pernas enquanto andava. Olhou a boca bem desenhada, as feições delicadas do rosto trigueiro, o suave relevo do decote.

Concentra, rapaz!, pensou em pânico, sentindo um filete de suor escorrer pelo canto do rosto, a garganta seca:

- Vamos tomar alguma coisa hoje à noite? – soltou ele, rapidamente.
- Ahn? – fez ela, erguendo os olhos do livro.
- Eu perguntei se você... – repetiu Luciano, dessa vez mais devagar, embora ainda não estivesse calmo – Se você gostaria de...de tomar alguma coisa hoje à noite...já que não tem aula...
- Aaah – fez Rita em um muxoxo – Que pena, mas amanhã eu preciso acordar muito cedo... – ela parecia realmente estar lamentando, pensou Luciano, aliviado.
- Por que não amanhã? – disparou a garota.

Amanhã? Luciano engoliu em seco. Bem no dia do jogo da Seleção! Brasil e Argentina, na final da Copa do Mundo! Em que mundo Rita vivia? Será que ela não se importava com o jogo do século, do milênio talvez?
Não, ela não se importava, e esperava a resposta, seus olhos grandes fitando o pobre Luciano. Foram aqueles olhos que o fizeram se decidir:

- Combinado! – disse ele, finalmente. – Vamos olhar o jogo na minha casa? – convidou, esperançoso de ter achado uma grande solução para o impasse.
- Pode ser... – concordou a Rita, sem se empolgar. E assim, com aquele ar blasé que deixava qualquer homem hipnotizado, voltou a concentrar-se no livro que estava lendo.

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13 de julho de 2014. 

Domingo. 

Na hora marcada, lá estava Rita, como um raio de luz que irrompe pela porta entreaberta. Estonteante, concluiu Luciano, admirando aquele corpo dourado dentro de um vestido justo como as leis divinas, o decote profundo como os ensinamentos de Nietzsche, a vozinha de mel a cumprimentá-lo:

-Oiee..


Foi um jogo difícil aquele. Porque o ataque da Argentina se insinuava a cada minuto, e porque Rita se aninhava cada vez no ombro de Luciano. Ele não era um jovem inexperiente. Sabia que ela estava no papo. Apenas queria deixa-la para depois do jogo, quem sabe comemorar o hexa no tapete da sala...

- Lá vem o Messi! – berrava Galvão – enquanto o baixinho ia serpenteando por entre os gigantes zagueiros brasileiros, chutando do bico da área, a bola zunindo, tirando tinta da trave, silenciando o Maracanã, indo para a linha de fundo – haaaaja coração, amigo! 

Quando o jogo acabou, em zero a zero, Luciano não aguentava mais tanta tensão reunida. A partida ia para os pênaltis. Meu Deus! Rita já não tinha mais paciência com aquilo tudo, e acariciava, provocante, a coxa de Luciano, mordiscava o seu pescoço, enlouquecia o pobre torcedor. 

Tudo tem limite, pensou Luciano, levantando num rompante e desligando a TV. Rasgou a roupa de Rita, amando-a de forma rápida e violenta. E então, Luciano dormiu, exausto por todas aquelas emoções, e sonhou com uma partida interminável, em que ele nunca descobria se o campeão era o Brasil ou a Argentina.


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