segunda-feira, 23 de maio de 2011

A proposta

  Norberto atravessou lentamente a rua, com os pensamentos confusos, alheio ao mundo ao seu redor. Enquanto andava, pensou na proposta que acabara de receber. Fazia apenas um mês que assumira o posto de inspetor sanitário, criticado pela namorada pelo baixo salário, mesmo após conseguir a vaga em um concurso tão diputado.

  Ele compreendia Sarah. A namorada não era uma pessoa ambiciosa, era prática. Ela sabia que os rendimentos dos dois não permitiam comprar a tão sonhada casa, marcar a data do casamento, sair para jantar em lugares caros, não permitia que levassem uma vida feliz.

  Porque o dinheiro era o grande motivo das brigas do casal. Norberto temia que Saah um dia cansasse do namorado brilhante e pobretão e preferisse partilhar a vida com outro, com menos inteligência e mais dinheiro para presenteá-la.

  E agora, isso. O homem de terno fora claro: daria R$ 20 mil para Norberto se ele alterasse os dados da inspeção feita no maior restaurante da região. Era um restaurante caro que atraía todos os turistas e magnatas que passavam pela cidade, mas que não tinha condição higiênica alguma, e certamente haveria uma grande repercussão disso na mídia após a divulgação do resultado.

  Norberto sabia que aceitar a proposta seria desonesto, algo que mataria o pai de desgosto. Sabia que aquilo iria contra os princípios da éticos que ele aprendera a respeitar desde pequeno.

  Mas Norberto também pensou nas vantagens de aceitar. Pensou na surpresa que faria à Sarah. Pensou em tudo o que poderiam comprar, em como a vida iria melhorar.

  Pensou também no que aconteceria se ele recusasse a proposta, se agisse como seu pai havia ensinado. Sabia que a relação com Sarah não resistiria incólume por muito tempo, sabia que a vida continuaria lhe fechando portas, que ele continuaria sendo um “zé ninguém”.

  No fim do prazo, Norberto suava frio. Em todos aqueles dias, era como se quanto mais ele pensasse mais confusa sua cabeça ficasse. O homem de terno pigarreou, impaciente.

  -E então?
  Falava com uma voz de quem costumava mandar, com uma voz que parecia não aceitar questionamentos ou falhas.
  -Ora, vamos, eu não tenho o dia todo!
  Todas as coisas voltaram à cabeça de Norberto em um turbilhão de pensamentos, que o deixaram atônito.
  -Eu não aceito – disse com voz fraca.
  - O quê!?
  - Eu disse que não aceito – repetiu, agora confiante.

   E saiu para a rua sem olhar para trás. Ele sabia exatamente o que havia feito. Sabia exatamente do que estava abrindo mão. Sabia o quanto a vida seria difícil dali pra frente, das humilhações que ele continuaria suportando.

  E honra lhe seja dada, ele não as ignorou.

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