segunda-feira, 4 de julho de 2011

O inimigo cruel

Era madrugada e Pablo caminhava lentamente pela calçada. Os muros da antiga escola agigantavam-se ao seu lado. Algo lhe comprimiu o peito com força e ele sentiu os olhos marejarem. A nostalgia e a saudade se misturavam mais uma vez. Ou seriam a mesma coisa?

E quanto mais ele andava, mais se sentia longe de seu destino. Teria mesmo algum destino? Pensou em ligar para algum de seus amigos, mas logo a ideia dissolveu-se em sua mente. Era inútil. Naquele inverno, àquela hora, ninguém sairia de casa para caminhar com ele, ninguém tinha vontade de conversar.

E Pablo sentiu-se só. Só pelas ruas de São José dos Ausentes, a cidade mais fria do Brasil. De repente, ele percebeu que não estava mais nas calçadas conhecidas de sua infância. A paisagem ao seu redor era tão branca que fazia os olhos doerem. Que lugar era aquele? Caralho, que frio!

E sentindo os pés afundarem no gelo a cada passo que dava, Pablo continuou caminhando, mesmo que estivesse na Sibéria. A falta de pessoas angustiava-o.

Enquanto caminhava, ele refletia: as coisas passam. O tempo então, voa. E agora? O que ele tinha feito para as pessoas que amava? Teria sido um bom amigo, um bom colega, um bom namorado? Teria sido um aluno de quem os professores gostavam?

As oportunidades haviam acontecido sem que ele tivesse se dado conta. Ah, se pudesse voltar no tempo! Porque só agora enxergava aquelas coisas? Mas como raciocinar com tanto frio?

Então, Pablo sentiu que seus pés começavam a afundar, mas não era a neve que o engolia. Aquilo era areia movediça! E quanto mais ele se esforçava, mais afundava, e quanto mais ele tentava gritar, mais tinha a certeza de que não sairia nenhum fio de voz de sua garganta. Ele ia morrer, sabia disso, sabia que não teria uma nova chance, pois não acreditava em milagres.

Na hora derradeira do último e desesperado suspiro, Pablo acordou. Consultou o relógio: 22h35. Ainda era cedo, fazia frio e a sensação de abandono do sonho persistia em seu peito. Era um domingo à noite.

E Pablo odiou o domingo à noite, àquele momento da semana em que não há fuga ou meio para afastar a melancolia e a tristeza. Odiou-o como só se odeia a um inimigo muito cruel.

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