sexta-feira, 19 de agosto de 2011

Os olhos de Mel (parte 2)


Mais uma vez, Mel pensou primeiro em Toni. Pensou no amado com a ternura de sempre e decidiu não incomodá-lo com o problema, decidiu passar sozinha por aquela dor. Toni já vivia tão atarefado, porque preocupa-lo com algo sem solução?

Os dias passavam, Mel emagrecia cada vez mais, perdia a cor, perdia as forças, mas Toni nada percebia. Toni sabia que quando chegasse em casa haveria um prato quente de comida lhe esperando, sabia que o pijama estaria cuidadosamente dobrado, e além do mais, ele estava tão cansado naqueles últimos tempos, não poderia dar muita atenção para a vida doméstica.

Naquela madrugada de terça-feira, Mel sentiu-se ainda mais fraca do que o habitual. Os ruídos no banheiro indicavam que Toni preparava-se para tomar banho. Que horas seriam? Cinco da manhã talvez. Pela primeira vez em vários meses, Mel cogitou a possibilidade de não preparar o desjejum do namorado.

Mas não. Toni não poderia sair de casa sem se alimentar, e além do mais ele poderia ficar decepcionado. Com muito esforço, Mel conseguiu soerguer-se da cama e arrastar-se até a cozinha, onde com extrema dificuldade deixou tudo pronto a tempo.

Toni entrou na cozinha, resmungou um ‘diaa’ e já saia comendo uma banana, quando Mel lhe chamou:

- Não vai tomar café?

- Bah, to atrasado – falou com a boca cheia, sem nem olhar para a namorada.

-É que eu não estou me sentindo muito bem... – começou, vacilante – Será que tu não podias ficar em casa hoje comigo?

Toni olhou para a namorada, uma ruga formando-se em sua testa. Diante dele não havia mais a bela garota por quem ele havia se apaixonado, apenas uma figura precocemente envelhecida. Os olhos de Mel, antes tão vivos e verdes, agora estavam desbotados.

- Não tem como, Mel. To cheio de serviço hoje... Beijo! – gritou a última palavra, já do corredor.

Passavam das dez da noite quando Toni voltou para casa, cansado, como sempre. Na sala, Mel estava caída, uma foto do casal ao lado do rosto trigueiro. Possivelmente a última imagem que ela vira com seus destacados olhos verdes. Olhos que agora estavam vidrados.

Toni, ao se deparar com a cena, refletiu sobre todas essas coisas e saiu da casa. Saiu para nunca mais voltar.

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